terça-feira, 30 de dezembro de 2008

A volta dos que não foram II: O retorno...


Aê galera, to de volta! E é pra botar pra fuder e revitalizar essa porra aqui que ta jogada pras traças, tava de fora por causa de um contratempo dos grandes com um vizinho que ficava com o roteador da internet do prédio, mais isso agora é passado e esquece essa porra aí, bola pra frente cacete!
Ano novo chegando e as idéias vêm surgindo, meu pai chegou de viagem e me trouxe um livro, um dos melhores livros que eu já li na vida, Rua dos Artistas e Transversais, de Aldir Blanc um doutor em psiquiatria e P.H.D em samba nascido em Vila Isabel (mais um filho pródigo de uma terra próspera) que conta nesse livro algumas passagens e histórias do seu bairro, não tem melhor no gênero, vão por mim.
Agora vocês devem estar se perguntando, Porque esse idiota ta falando essa presepada toda? Eu gostei tanto dessa porra que agora eu vou postar PELO MENOS um dos contos mais legais pra vocês lerem no blog por mês, vou começar por hoje, fiquem felizes e na boa companhia desse cara que é fodaÇÇo, boa leitura.


A posição da Clotilde


O Pelópidas era a tranqüilidade em pessoa. Chegava do trabalho, calçava os chinelos, botava um paletó de pijama em cima da camiseta e ia pro quintal. Depois de regar uma plantinha aqui, bater um prego lá, sentava-se num banco, acendia um Mistura Fina e ficava dizendo coisas pra si próprio:
- A goiabeira tá carregadinha. . . até que hoje tá fresquinho. . . bom, vou até a esquina tomar uma cervejinha.
E saía, jornal embaixo do braço, tão discreto que, praticamente, ninguém notava.
Praticamente, porque uma pessoa notava: Clotilde, segunda mulher do Pelópidas. E não somente notava, como corria pra janela e, por detrás das venezianas, zurrava:
- Já vai, hein? Lá é que é tua casa, né?
Uma pessoa que não soubesse da situação diria que tais palavras não eram dirigidas ao Pelópidas.
Ele seguia sorridente, e parava pra escutar um passarinho, passava a mão na cabeça dos meninos, tinha uma frase gentil pra cada morador da Rua dos Artistas:
- Como está, Dona Otília? E a asma? Ou então:
- Quero ver no domingo, hein, Lindauro. . . barba, cabelo e bigode. . . dizem que o Castilho não joga.
Até mesmo Isolda, com má fama e tudo, merecia sua atenção:
- Boas tardes, senhora.
Mal entrava no boteco:
- Salta uma Portuguesa caco-escuro pro nossa-amizade!
Essas pequenas demonstrações de afeto emocionavam o Pelópidas, que ficava com um pigarrinho de fundo nervoso:
- U-hum... Obrigado. Seu Joaquim. Como vão todos?
Enxugada a lourinha, Pelópidas fechava o jornal, pedia com distinção "a conta" e voltava pra casa assoviando sempre o mesmo chorinho - o Naquele tempo, do Pixinguinha e do Benedito Lacerda, que se o amigo leitor não conhece, deve, agora mesmo, enfiar a cara no vaso sanitário e puxar a válvula.
Já dentro de casa, ligava o rádio pra escutar - se não me falha a memória - Jerônimo, o Herói do Sertão.
A tranqüilidade em pessoa, ria com o Moleque Saci, enquanto aparava com destreza um calo no mindinho do pé esquerdo.
- Sempre com a mão naquele pé sujo, mamãe. . . É. . . Mas eu já cansei de falar. . . A casa dele
é o botequim.
Todo dia, na hora do Jerônimo, Clotilde com a mãe no telefone:
- Quando acaba essa desgraça desse tal herói não sei de quê, ele janta que nem um porco e vai
pro quarto enquanto eu lavo a louça. . . Pois é, mamãe. Ronca pra cachorro. Não me deixa dormir a noite toda, só a senhora vendo. . . Carinho? A senhora tá brincando! Ele não cumpre o dever faz uns seis meses. . . É. . . Tá borocoxô.
-Ué, posso fazer nada, mãe. . . Fico no ora-veja. . . Ele não dá valor ao que tem em casa, mamãe. . . Pelo que os homens me dizem na rua, eu tô muito bem conservada.
-Conservada, Clotilde? Só se for em formol! A cara era uma verdadeira granja: pé-de-galinha pra todo lado. Vê se te manca!
-Quem tá escrevendo esse troço sou eu e tu não vai ficar aí de palhaçada. Conservada, uma pinóia! Sua bruaca bexiguenta! Dromedário de subúrbio! Sofá da Tamakavi!


Desculpem o desafio, amigos, mas o Pelópidas comia feito um passarinho, lavava a louça pra aquela cobra toda santa noite, não roncava bosta nenhuma, e quando ia deitar já encontrava a megera toda esparramada, de boca aberta fazendo um barulho semelhante ao de um Scania Vabis. Mesmo assim, ele abraçava o monstrengo e - pasmem! cantarolava canções de ninar. Dava uma bimbada naquele fole dia sim, dia não, e ela, cínica, fingia que tava dormindo, mas bem que se acabava. De manhã cedo, o Pelópidas, um verdadeiro santo, trazia o café na
cama e perguntava:
- Essa noite foi bom? Tu gostou?
A lacraia disfarçava, a boca lambuzada de manteiga:
- Gostou de quê? Tá maluco?
Não dizia nada, vestia o terno e ia trabalhar. Uns dez passos fora de casa, esquecia tudo: uma pipa lá no alto, um risco de amarelinha no chão - ele começava a assoviar .
Naquele tempo e bola pra frente.
Só uma vez nosso herói respondeu mal, e, assim mesmo, por engano. Havia tido um dia desgraçado na repartição, um calor de matar, o chefe de seção criando caso, um
inferno... Depois da cervejinha, enquanto ouvia o Jerônimo, cochilou e sonhou com a segunda lua-de-mel, passada com a Clotilde no Quitandinha.
A onça, pra variar, falava com a mãe no telefone:
- Mas, mamãe. . . ele é um sádico, é um peso na minha vida. . .
Quando o maracujá-de-gaveta notou que o pobre Pelópidas tava cochilando, levantou ao máximo sua voz de muar:
NÃO SEI QUE POSIÇÃO TOMAR DIANTE DISSO!

O Pelópidas, coitado, que teve seu lindo sonho interrompido dessa forma, confundiu tudo, e, meio dormindo, meio acordado,
disse com um sorriso dos mais safados:
- Posição?. . . Acho que deverias tomar naquela que tanto apreciamos, com as mãos nas bordas da banheira.

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SoSuechtig, Burajiru